Cabernet Franc, vinhos varietais e o Valle de Lontué

Olá,
Esta coisa de vinhos monocastas ou varietais, apesar de também ocorrer no chamado Velho Mundo, é tido como mais uma invenção dos países neo-chegados à arte da vinificação. Chile, Argentina e Uruguai, nossos vizinhos e visitas habituais às nossas taças tem, cada qual, a sua casta emblemática e trabalham a sua força de marketing nesta direção.
Costuma-se atribuir isto a uma facilidade do novo consumidor em reconhecer suas preferências ao identificar-se com uma uva e, assim, tornar-se mais íntimo do vinho.
De certa forma, principalmente no início da jornada, isto faz algum sentido. Afinal, não é tarefa fácil familiarizar-se aos labirintos que se formam pela cultura do vinho na Europa, em especial na imensidão de regiões e características dos vinhos franceses; Bordeaux e Borgonha, bastam para uma vida, incansável, de estudos.
É preciso dizer, entretanto, que os vinhos monovarietais, naturalmente, carecem das nuances que se alcançam a partir da mistura de duas, três ou mais castas… Em Châteauneuf-du-Pape, por exemplo, chegam ao absurdo de misturar até 13 uvas. Nestes casos, cada vinho, é um vinho. Um temperinho de uma casta diferente é capaz de verdadeiros “milagres”. É um aroma novo aqui, um reforço de cor ou taninos ali… Um frescor mais acentuado, e por aí vai…
Embaladas por este movimento, as castas francesas aproveitaram para ganhar o mundo. Não há, hoje, país de tradição vinícola sem os seus vinhedos, em escala considerável, de Cabernet Sauvignon e Chardonnay, assim como, de Merlot, Pinot Noir, Syrah e Sauvignon Blanc, entre outras.
Vieram de lá, também, a Malbec de Mendoza e a Carménère chilena, estas, porém, parecem ter encontrado melhor abrigo em seus destinos, adotando-os como novas moradas.
A lista de outras castas é imensa, assim como há grande diversidade de origens, mas hoje eu vou falar sobre a Cabernet Franc, uva que compõe a trinca de uvas de Bordeaux e que, em sua margem direita, é o tempero que a Merlot precisa. Aliás, encontra ali o clima frio perfeito para a sua maturação.
Com bagos maiores do que a “outra” Cabernet, a Sauvignon, seus vinhos tendem a ter menos carga tânica. Somam-se às características da Cabernet Franc um herbáceo até mais acentuado, menos corpo e cor. Encontra outra boa morada na região centro-oeste do Vale do Loire, onde reina soberana nos elegantes tintos de Chinon e Bourgueil, por exemplo. Na Itália, em especial no Friuli, é também muito apreciada.
Na América do Sul, encontram-se vinhedos e vinhos de Cabernet Franc em todos os países produtores, ainda que em nenhum seja dominante. No Uruguai, algumas bodegas a usam para arredondar a Tannat para um consumo mais imediatista.
No Brasil, os varietais de Cabernet Franc gozaram de muito prestígio até o fim da década de 1990, perdendo espaço para os vinhos mais carnudos da Sauvignon e para os Merlot da Serra Gaúcha. Vejo, recentemente, um movimento de resgate de suas vinhas e vinhos, com resultados interessantes – ainda não confirmados por mim – em novas fronteiras, como no Sul de Minas Gerais, região de Cordislândia, e também em Espírito Santo do Pinhal, interior paulista. Espero, em breve, poder provar estes vinhos, pela curiosidade dos resultados com a casta e o inusitado terroir.
Nesta busca por um Cabernet Franc sul-americano e de clima mais ameno, chegamos ao Chile, em especial, ao frio Valle de Lontué, uma sub-região ao sul do Vale de Curicó, há mais de 200 km ao sul da capital Santiago, onde estão estabelecidas algumas das maiores vinícolas chilenas.
Situada entre os Andes e a faixa costeira, a região de Lontué beneficia-se de um clima de características mediterrânicas, com pouca chuva – concentradas no inverno – e boa amplitude térmica entre os dias e as noites. Seu clima favorece às variedades de maturação mais tardia, como é o caso da Cabernet Franc (ainda que esta seja menos extrema do que a Sauvignon).

Korta Barrel Selection Reserve Cabernet Franc 2012
Korta Barrel Selection Reserve Cabernet Franc 2012
Rubi violáceo de boa densidade e brilho. Aromas frutados que trazem a lembrança de frutos negros, toques florais, especiarias, terra e uma presença leve da madeira. De médios corpo e frescor, seus taninos mostram vigor e boa textura, preenchendo bem o palato. Confirma as notas frutadas. Termina redondo, com boa harmonia e permanece longamente com a fruta e floral a darem a nota.
Terceiro vinho das Bodegas Korta que provo e comento (Viognier, aqui, e Pinot Noir, aqui), manteve a boa impressão de um trabalho cuidadoso e de vinhos bem acabados e gastronômicos.
Com preço perto da casa dos R$ 50, é uma boa compra e vale como introdução à Cabernet Franc, em especial, à interpretação que se pode conseguir em terroir chileno. Um vinho gostoso, alegre, acessível em sua juventude e que demonstra relativo potencial de afinamento para os próximos anos.

3 – Bom vinho. Correto, sem grandes pretensões.
Onde Encontrar: Vinho & Ponto
Bodegas y Viñedos Korta – Valle de Lontué – Chile
100% Cabernet Franc
12 meses em barricas francesas e americanas
14% vol álc
Harmonização: Carnes brancas ou vermelhas magras
Guarda: Pronto, porém, deve apresentar evolução – afinamento – nos próximos 3 a 5 anos.